sexta-feira, 29 de maio de 2009

Não é moderno e sim eterno

DE BAR EM BAR - Nova Capela


O tempo mudou radicalmente hoje. De dias bonitos e iluminados (a luz de maio é deslumbrante) passamos à chuva e ao frio (sim, você que é de fora: faz frio também no Rio, apesar da propaganda). Um bom pretexto para tomar um conhaque. Eis que fomos eu e S. ao Nova Capela: estava mais do que na hora de fazer uma coluna na Lapa. E o escolhido para a inauguração não poderia ser outro. Chegamos já de noite, mas num horário ainda tranquilo em se tratando do Capela, que vara as madrugadas aberto – e cheio. Hoje é sexta-feira e daqui a pouco vai fervilhar até o dia amanhecer.

O bar tem aquela aura de lugar eminentemente carioca. É, pois, o lugar do “carioca essencial”, conforme um senhor lê numa das muitas matérias de jornal emolduradas na parede (que também exibe quadros de mulheres louras, morenas, negras; há, ainda, algumas gravuras, quadros de esportes, prêmios recebidos pela casa e cartazes de cursos e shows. De um tudo). “E o Caetano, você viu?”, quer saber o mesmo senhor. “Cadê?”, sua acompanhante, excitada, já o procura com os olhos. Não, ele não está no bar. O senhor explica que, por uma força estranha, Caetano Veloso caiu do palco, em Brasília. Mas foi só um susto. (Como lhe fez bem a banda de garotos modernos e, obviamente, talentosos. Fui ver o ótimo show de lançamento do CD Zii e Zie. Caetano está leve e mais eterno do que nunca.)

Por falar em modernos, adentra o bar uma horda deles. Até então havia apenas alguns casais mais velhos e algumas duplas de amigos. Os “modernos” sentam-se numa mesa atravessada, próxima à minha bem no canto à direita. É possível identificar logo três sósias no grupo. Há o do Marcelo Tas; há um do Mike (o gordinho louro de cabelo encaracolado e óculos, filho mais jovem do Paul do programa American chopper) e, supra-sumo dos modernos, um sósia do grande Frank Zappa. Mas o que faz alguém ser “moderno” (com aspas)? Seria só o visual incomum, pretensamente criativo? Não só, caro leitor. É também a afetação, o compromisso de ser “moderno”, antenado, up-to-date. O “moderno” é o antimoderno.

Para abrir os trabalhos, eu e S. pedimos um chope e bolinhos de bacalhau. Estes vêm sensacionais: saborosos, crocantes. Para prolongar mais a estada, antes do transcendente cabrito com arroz de brócolis, cogitamos pedir umas fatias de presunto cru. Mas o preço da porção nos fez abrir pequeno debate sobre o que é felicidade. Acabamos por optar pela satisfação do singelo prazer. E Deus foi testemunha: apesar do preço salgado (ou por causa dele), estavam incrivelmente tenras e viçosas.

- Ah, Fulano é um cara maneiro. Gente fina! – diz o Mike.

- Gente fina mesmo! – e o outro estica o dedo mindinho, como que a dizer: “macérrimo”.

Como Irene, Frank Zappa ri. Fiquei na expectativa de uma boa frase, quiçá um gesto, algo que justificasse a coluna. Foi em vão. Desse mato não saiu download. Pedimos então a meia porção de cabrito, que dá perfeitamente para duas pessoas. Veio magnífica, como sempre. O Nova Capela, como o poeta, não é moderno, também é eterno. Saúde e até a próxima.


Nova Capela – Rua Mem de Sá, 96, Lapa (2252-6228)