quinta-feira, 24 de junho de 2010

O cabrito fica pra próxima

DE BAR EM BAR – Nordestino Carioca

Em algumas das colunas recentes, explorei a comida de boteco que vem da parte do país Bahia acima, indo ao quase turístico Estação Baião de Dois, na Feira de São Cristóvão, e também a de um Brasil mais longínquo, no Arataca de Copacabana com sua culinária do Pará. Dessa vez, fechando uma pequena trilogia, me embrenhei por um Nordeste profundo e fui ao Nordestino carioca, em Jacarepaguá (Anil).

Logo de cara sou arrebatado ao chegar ao bar, pois se destaca na parede central um enorme escudo do meu querido Botafogo. Isso por si só já seria o suficiente para ter toda boa vontade com a casa. Mas o amigo leitor sabe perfeitamente que esta condição não vale para encher de loas nenhum estabelecimento. Porque, se a paixão pode até nublar o raciocínio, na hora decisiva os prazeres da mesa não fazem distinção entre geografia, política, religião, times de futebol ou o que quer que seja. Dito isto, vamos ao que interessa.

“Nem no Piauí se come um cabrito como o daqui!”, é como sou recebido pelo dono, o paraibano Roberto Salles, que por sinal trabalhou muitos anos na Feira de São Cristóvão. É um autêntico personagem. Paramentado com chapéu de couro, o senhor de óculos de alto grau e bigodinho, é animado à beça. Contador de histórias, repentista, ele ainda faz a propaganda do irmão cantor, Chico Salles, e mostra todo orgulhoso o CD do (outro) artista da família.

São aproximadamente 11 horas da noite de quinta-feira e o bar está bem cheio. O que nada impede que a casa, decorada com garrafas de cachaça, objetos típicos e quadros com motivos regionais, seja muito agradável. Instalo-me na varanda e observo, além do movimento interno, a esquina bucólica e a lua cheia a nos proteger, a todos os boêmios, até onde a violência nossa de cada dia permite.

Peço uma cerveja Original e um bolinho de carne seca empanado. Enquanto degusto a ótima iguaria, atento para outras boas opções do cardápio, como por exemplo: baião de dois, cabrito ensopado, galinha de cabidela, lasanha nordestina, sarapatel e codorna na brasa com farofa de milho e molho à campanha. Para abrir ainda mais a fome – e continuar no clima poético –, solicito uma cachacinha, claro, da marca Lua Cheia.

Aproveito então para experimentar o petisco concorrente à terceira edição do Festival Comida di Buteco, que se encerra no próximo domingo. É o “caldo da caridade”, que vem a ser um encorpado caldo feito com carne moída, ovos cozidos, farinha de mesa e temperos nordestinos. Caprichado e até segura a onda etílica. (Preferi deixar o cabrito para outra oportunidade.)

Para finalizar, um rápido pitaco sobre a ralentada polêmica dos tira-gostos elaborados para o concurso pelos 31 bares cariocas em disputa. Há os que defendem que isto seria uma traição aos “atrativos genuínos” dos botequins. Em minha opinião, muito pelo contrário – quando as (boas) criações acrescentam e se incorporam à cultura de boteco. Em última análise, no confronto entre inovação e tradição, quem decide é o freguês. Saúde e até a próxima.

Nordestino Carioca – Av. Sargento Carlos Argemiro Camargo, 49, Jacarepaguá (3412-3353)