sábado, 27 de fevereiro de 2010

Uma pequena teoria sobre a verdade

(Perfeita para políticos que usam cuecas, meias e panetones para outros fins):

“A verdade pode encontrar uma maneira terrível de ser muito engraçada, especialmente quando se trata de ganância e hipocrisia.”
(Kurt Vonnegut, Hócus Pócus)

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Um mexicano sem dramalhão

DE BAR EM BAR - Rota 66


Dessa vez fui na sequência a um segundo bar e é sobre ele a coluna de hoje. Depois de voltar do Aconchego Carioca, na Praça da Bandeira, que já estava quase fechando (mas ainda deu para aproveitar algumas de suas delícias, como a moquequinha de camarão com uma Original geladíssima) – isso no mesmo dia em que o bar coirmão Petit Paulette, na mesma rua, do artista-cozinheiro Paulo Barbosa, foi assaltado (força, Paulette).

Cometerei aqui uma brutal inconfidência, amigo leitor. O motivo da esticada foi que eu e S. precisávamos continuar a fazer o inventário de nossos humildes bens. Em resumo – para não entediá-lo –, continuamos nosso casamento, mas agora em casas separadas. Deu para entender? Portanto, embora não fosse o caso de nenhum dramalhão mexicano, fomos para o Rota 66, bar mexicano (ou tex-mex).

Atravessando o túnel e chegando na filial do Leblon, no início da Conde Bernardotte, no trecho onde há aquela grande concentração de bares, o ambiente estava tranquilo, medianamente ocupado. Uma mesa de família e outra de amigos vendo o futebol na TV no salão interno; na parte de fora, uma mesa grande de cinco ou seis mulheres e outra de uma dupla de amigas. Ou ex-amigas, pois elas discutiam asperamente e acabaram indo cada uma para um canto antes que chegasse o meu primeiro chope. (Raro ver bate-boca feminino no boteco... mas por que só nós teríamos o privilégio do mico?)

O bar é todo revestido de madeira. Nas pilastras e paredes, quadros de motos, de carros, de marcas de cerveja e, obviamente, de uma certa estrada. Digno de nota: um quadro enorme de um pára-choque de carro antigo na parede principal, à direita de quem entra no bar. No fundo, um bonito balcão. Mas nos sentamos na parte externa, de frente para a calçada. Para acompanhar o chope, pedimos um combo mex, que vem a ser tortillas com os molhos: sour cream, guacamole, pico de galo (tomate e pimenta jalapeño) e chilli beans.

Outras pedidas do cardápio: super nachos, flauta (rolinhos de tortilla recheados), linguiça flambada na tequila. E os pratos enchilada, quesadillas e burritos. Para beber, claro, tequila, michelada (servida na caneca com sal na borda, cerveja, gelo e limão) e mais chope da Brahma, cervejas Bohemia, Stella Artois, Dos Equis, Sol e drinques variados. O tal combo mex veio ok, todos os molhos despertaram vivo interesse – e corresponderam.

Enquanto eu e S. conversávamos sobre certas medidas chatas mas necessárias – de forma amena, felizmente –, observei a mesa das cinco mulheres. “Arruma um namorado pra mim... eu vou achar maneiro!”, dizia uma delas, a mais jovem. Era, aliás, a que mais falava. Aparentemente a que teria maiores expectativas de encontros e de belas histórias com que sonhar. As outras, de longe (e talvez só de longe), mostravam-se práticas e decididas: “Ela me falou: ‘Muito apessoado...’ Que diabo é isso?!” Ah, o amor. Hoje o amor verdadeiro é produto em baixa no mercado das almas. Por isso, estamos aqui agora, nessa Rota 66 que, afinal de contas, cumpre o que promete. Ah, o amor... Saúde e até a próxima.

Rota 66 – Rua Conde Bernardotte, 26, lojas B e C, Leblon (2512-5961)

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Uma pequena teoria sobre livros

“Os livros são, sejamos realistas, melhores do que qualquer outra coisa. Se criássemos uma espécie de luta de boxe cultural e fizéssemos com que os livros disputassem 15 rounds no ringue contra o melhor que qualquer outra forma de arte tivesse para oferecer, então os livros não perderiam nenhuma partida. Pode verificar, se quiser. A flauta mágica versus Middlemarch: um estudo da vida provinciana? Middlemarch ganha de seis a zero. A última ceia versus Crime e castigo? Ponto para Dostoiévski. Está vendo aí? Não sei se isto é muito científico, mas parece que os romances estão ganhando disparado. É claro que há sempre algumas pequenas exceções – a canção Blonde on blonde pode dar um banho no livro A loja de antiguidades, por exemplo, e eu não apostaria muito em Fogo pálido contra Cidadão Kane. E volta e meia icaríamos chocados, pois isso acontece no mundo dos esportes, de forma que De volta para o futuro III poderia dar a sorte de acertar um soco bem na cara de Corre, coelho; mas, em 99 por cento dos casos, continuo torcendo para a literatura.”
(Nick Hornby, Frenesi Polissilábico)

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Três (ou mais) brindes a Juliana

DE BAR EM BAR - Bar Central da Ponte


Mal nos sentamos sob a marquise, o rapaz avisou:

- Tá gelada, mas só tem três.

Referia-se à pedida Brahma Extra. (Mas como assim? Eu e meu amigo por acaso temos escrito na testa: “Vou tomar todas!” ou “Pé-de-cana”?) De qualquer forma, o atendente, como se mostrou depois, foi atencioso com o freguês. E nós, a bem da verdade, passamos das três, fácil.

Fui ao bar dessa vez com o amigo Humberto Effe. Nós tínhamos combinado de tomar uma cerveja, após a gravação do seu programa na rádio Roquette Pinto, Sangue novo, do qual fui o convidado. Trata-se de um espaço valoroso numa rádio que vem se renovando. Levei os discos Canduras, de Qinho, um jovem talento carioca, e o recém-lançado Labirinto vertical, de Sérgio Serra, virtuoso guitarrista que tocou no Ultraje a Rigor e também com Lobão, Barão Vermelho e Cássia Eller. Serginho lançou um disco solo surpreendente, com boa poesia e ecos de MPB.

Inicialmente iríamos a um bar no Centro, perto da rádio. Mas como a sua filha Juliana estava prestes a nascer, Humberto pediu-me para irmos a um bar perto de sua casa – e perto de sua mulher Tininha, para estar pronto para qualquer eventualidade. Pedido que era, portanto, uma ordem inquestionável, das mais agradáveis de cumprir. Por isso, cá estamos no Bar Central da Ponte, na rua Jardim Botânico, quase em frente à vila onde ele mora.

Sobre o curioso nome do estabelecimento (“Central da Ponte”), como diria o jornalista e escritor Otto Lara Resende, cuja estátua fica num larguinho defronte ao bar (virando-se para a rua Pacheco Leão e o Jardim Botânico): “Sei alguns minutos de alguns assuntos. E não sei nada.” Confesso que não consigo ver a ligação do nome com o local. Mas isso não importa. O que vale é que o boteco é um pé-sujo dos melhores. (Ainda que tenha um banheiro igual ao da maioria.)

Sentamo-nos numa das mesinhas de madeira e toalha verde entre a estátua de Otto e os engradados na porta do bar. (Há bares temáticos, ou pé-limpos, que utilizam engradados como cenário; aqui é a vida real mesmo.) A cerveja veio geladíssima, fundamental no verão cada vez mais sufocante do nosso planetinha superaquecido. Além da Brahma Extra, a casa oferece Antarctica, Skol, Brahma, Itaipava e Bohemia. Para beliscar, há porções de pernil, queijo minas, salaminho e contrafilé. Pedimos a de queijo-de-minas, que veio excelente. Tanto que repetimos a dose, para acompanhar a cerveja, que passou a ser Bohemia. Entre os pratos, carne assada, rabada e mocotó.

Eu e Humberto conversamos sobre diversas coisas. O cantor e compositor do grupo Picassos Falsos é daqueles que têm a inteligência atenta aos detalhes. Falamos sobre a minissérie Dalva e Herivelto (“Herivelto não era aquele crápula que mostraram”), sobre o sambista Ismael Silva, sobre parceria (e o dia em que fomos à Vila Mimosa para conferir a verossimilhança de Vou à Vila, uma composição nossa, ainda inédita) e, claro, sobre filhos. Aliás, esta coluna publicada hoje quando Juliana já está bem aqui, neste mundo vasto mundo, é dedicada a ela. Saúde e até a próxima.

Bar Central da Ponte – Rua Jardim Botânico, 758, Jardim Botânico (2294-4295)