sexta-feira, 21 de agosto de 2009

É impossível tomar um só

DE BAR EM BAR - Bar Brasil


Parafraseando mestre Fernando Sabino, dei continuidade à eterna busca de errar à toa pelos bares certos, indo numa sexta-feira dessas a um local que não dá margem à dúvida. É daquele tipo de estabelecimento que se você, amigo leitor, fechar os olhos ao entrar e imaginar que está em 1997, tudo bem; se pensar 1986, ok, também. No caso, o bar tem mais de um século e passou apenas por quatro reformas. Ele é o mesmo desde que eu o conheço, e posso garantir que não foi ontem. Estou falando do célebre Bar Brasil, na Lapa.

Chego num horário em que ainda predominam as turmas de trabalho e os mais experientes (vejo dois colegas rindo muito, ao meu lado; noutra mesa, na diagonal, um senhor de suspensórios com pinta de velho lobo da arquitetura traça um kassler, acompanhado por um amigo; noutra, um casal cinqüentão namora e, ainda, à minha frente, observando tudo e a todos, há um velhinho empertigado de camisa social e bermuda, solitário). Por volta dez da noite começa a surgir a galera mais jovem, que veio agitar na Lapa fervilhante e passa antes aqui para tomar um chope, já que a casa fecha à meia-noite, sem choro nem vela.

O chope do Bar Brasil merece um parágrafo à parte. Porém o que dizer, quando sobre ele quase tudo já foi dito? O que sei é que é impossível tomar um só. Vem na temperatura e pressão ideais. Um primeiro gole é um bálsamo para as pupilas gustativas e logo me faz lembrar de Tom Jobim e sua expressão “o chope dourado da felicidade”. Para beliscar, peço um ótimo patê de fígado de vitela com pão francês.

Pelo salão em formato de bumerangue, de repente ecoa um espirro. Algum gaiato não perde tempo: “Olha a gripe suína...” As pessoas riem amarelo. O temor generalizado naturalmente já se evidencia nos bares. Por exemplo, um rapaz que chega numa mesa perto da porta, com quatro mulheres e um homem, abraça-as de mão fechada e não aperta a mão do outro homem, dá-lhe o braço; feito isso, vai ao banheiro lavar as mãos – que também foi a primeira coisa que fiz, hipocondríaco que sou, quando aqui cheguei. É ou não é o fim da picada?

Mas vamos falar do bar, que ele merece. Aqui você pode comer sem susto porções de bife à milanesa (por mais estranho que isso possa parecer), salsichas variadas, rosbife, kassler-rippen, ossobuco de vitela. Ou os pratos de kassler defumado com vários acompanhamentos, dobradinha, língua ao molho de páprica, salsichão suíço com chucrute. Peço mais um chope e o joelho de porco (eisben) frito e crocante, cortado para petisco. Bem... não penso mais nos problemas.

Antes de finalizar, gostaria de me referir ao casal de cinquentões em pleno namoro. Passo a observá-los, enquanto degusto a lentilha amiga para rebater a saideira. A senhora loura faz o tipo que malha, bracinhos fortes e ares de menina; ele é um senhor moreno, meio gordinho. Ela fala sem parar. Ele procura demonstrar interesse, mas por um instante desvia o olhar para a bandeja do garçom e a acompanha, ávido, até o destino final. Como bom gordinho. Ela nem notou que ele não a ouvia mais. Saúde e até a próxima.

Bar Brasil – Rua Mem de Sá, 90, Lapa (2509-5943)