terça-feira, 26 de abril de 2011

A Suíça do Brasil

(A SOMBRA DO FAQUIR 15)





No mundo de hoje do vôlei masculino, alguém com 1,80 m como eu (que fui nada mais do que um razoável levantador em peladas do Piraquê), é um anão. (E pensar que um nome fundamental para o estágio atual do voleibol brasileiro, o ex-jogador Bernard, um dos melhores do mundo em sua época, tinha – tem – 1,87 m). O fato impiedoso é auto-explicável ao se assistir a um jogo de Liga Mundial ou de Olimpíadas, por exemplo, entre Rússia e Sérvia, ou Cuba e Holanda. Só tem gigante altamente vitaminado. Até os levantadores já possuem bem mais de dois metros.

Quando o Brasil começou a se destacar no cenário internacional, nos anos 80, a partir da geração que contava com Moreno, Bebeto e Luís Eymard para a seguinte com Fernandão (que na verdade veio da anterior), Bernard, Bernardinho, Montanaro, Amauri, Xandó, Badá e Renan, um atacante de, digamos, 1,95 m era considerado bem alto. Xandó, com um centímetro a menos, era um que estraçalhava qualquer defesa e abria um buraco na quadra adversária. Isso com a cara e a atitude de quem estava ouvindo rock´n´roll. Renan, com apenas 1,90 m, era um supercraque que fazia tudo bem – do ataque rápido e certeiro (um dos primeiros a bater a bola chutada na ponta) à recepção de líbero e até o levantamento de quem sabe. Além de ter sido objeto de desejo da platéia feminina – tão logo o esporte começou a lotar ginásios grandes como o Maracanãzinho e o Mineirinho.

Por falar em levantamento, esse quesito merece o destaque de um voo solo, já que solitário (taticamente) é o levantador, pois é ele quem pensa o jogo. O Brasil sempre se notabilizou por excelentes levantadores. Vitinho, lenda do Fluminense, e Bebeto de Freitas são algumas referências até se chegar ao capitão William da geração de prata. William Carvalho da Silva era um maestro, muito habilidoso, mestre da finta. Foi muito bem substituído na seleção por Maurício, o grande Maurício campeão olímpico (juntamente com Carlão, Tande, Giovane, Marcelo Negrão e outros). Depois veio o Ricardinho, o melhor de todos. Ricardinho, aos 31 anos, ainda desfila em quadra toda a sua genialidade, porém não mais na seleção – dizem que por problemas de ego. Pode ser. O que sei é que ele praticamente inventou um outro jogo aos distribuir as bolas com extrema velocidade e em variadas posições, para que atacantes bem mais baixos que os bloqueadores pudessem ultrapassá-los com frequência. Tanto que o Brasil passou a dominar o esporte nos anos 2000.

O que poderia ser um problema – a ausência de Ricardinho na seleção brasileira – acabou se revelando uma ótima solução para novos talentos terem seu espaço em nível internacional. E hoje há uma quantidade absurda de levantadores excepcionais atuando nos times do nosso campeonato mais importante e difícil, muito valorizado pelo repatriamento de vários craques. Só na última Superliga (2010 / 2011), eram pelo menos cinco levantadores brasileiros que podem ser chamados de brilhantes: Sandro (o campeão), William (o vice, que jogou na Argentina, conhecido por lá como o Mago), Marlon, Bruninho e o próprio Ricardinho. E a altura dos jogadores desta posição também tem aumentado muito. Já possuímos até levantador que ultrapassou a barreira dos 2 metros, como o jovem Fidele, de 2,08 m – uma das apostas do técnico Bernardinho para a seleção do futuro.

Quanto aos atacantes, nem é preciso frisar que a altura e a força hoje também são patrimônio nacional. De tal modo que uma das recentes revelações, o oposto Wallace, que jogou a última Superliga pelo Cruzeiro, o nosso atacante cubano, pela impulsão e vitalidade, é considerado baixo: tem somente 1,98 m. Isto porque contamos cada vez mais com atletas que são arranha-céus como Leandro Vissotto, com 2,12, Lucão, com 2,09, Éder, com 2,05 e Sidão, com 2,03. Mas o voleibol, apesar de toda a evolução física, ainda é um esporte em que a habilidade e o talento são preponderantes. Não é à-toa que o melhor jogador do mundo é brasileiro e olha para cima ao falar com estes atletas citados. É o ponteiro-passador Murilo Endres, com 1,92 m – como foi também o caso do campeoníssimo Giba (ainda em atividade e jogando bem), da mesma altura, e antes, de certa forma, também de Nalbert, um pouco mais alto, com 1,96 m. Todos seguindo a trilha de Renan.

Mas uma coisa é intrigante nesta história toda de sucesso e superação: o que faz com que o vôlei tenha tanta gente altíssima num país em que a grande maioria do povo (além da estatura mediana) não tem as condições elementares de saúde? E mais: como o vôlei conseguiu atingir um padrão de excelência que tem se mantido por mais de uma década inclusive nas categorias de base? – situação hegemônica que nem sempre ocorre no futebol, o nosso esporte número um. Tudo pode ser resumido em duas palavras: planejamento e organização. O Brasil do vôlei é a nossa Suíça. Por acaso ou não, um dos precursores desta jornada vitoriosa foi o jogador Jean Luc Rosat, o Suíço, atleta do Botafogo e da seleção brasileira, um dos principais jogadores do vôlei carioca, dotado de recursos extraordinários, que atuava como atacante e até como levantador.

Por fim, cabe ressaltar ainda que o planeta do vôlei é um reduto de amizade e ética. Um belo exemplo foi oferecido esses dias pelo maior jogador do mundo, Murilo. Eleito o melhor em quadra na final da Superliga, deu espontaneamente o seu prêmio para Víni, que realmente havia se destacado mais na partida, o meio de rede que era o patinho feio do time do Sesi, o único titular não convocado para a seleção brasileira. Lembro-me também de um amigo de colégio, Guilherme Rezende. Guilherme vem de uma ilustre família de jogadores de voleibol, quase todos levantadores: Rodrigo, Bernardinho e Dudu, seus irmãos, e agora o Bruninho, o sobrinho. Bernardinho transformou-se no melhor técnico de todos os tempos. Bruninho é a evolução da espécie como jogador. Guilherme, embora tenha até participado de seleções de base, não seguiu adiante com o esporte, mas é um advogado bem-sucedido e continua amigo de seus amigos dos velhos tempos. O Brasil de todos nós ainda está longe de ser o Brasil do vôlei. Muito longe. Mas o que importa é que esta ilha de excelência existe – e que bem pode nos servir de modelo para muitas outras áreas.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

3 Dias de Havaí

Depois da crise,
o Havaí.
Depois do baque, do colapso
de toda a merda
Da expectativa realista de vir a ser
simplesmente consagrado
como um cara legal, tranquilo
O nada, a terra arrasada
o passar de perna da realidade
À margem do complô dos incomodados
do olho grande
do pacto camuflado dos gente fina
(Tudo isso é besteira.)
Depois da crise,
o Havaí
Pelo menos por três dias.
O Havaí é aqui, no Bairro Peixoto
É o Arpoador, é o Posto Seis, é o Leme
Contra a mente estressada
e o fantasma de voltar a trabalhar
no que me assassina, no que me faz mal.
Normal.
Sou um cara como qualquer outro
que acorda às sete e reza pra chegar a sexta
Um bom filho da puta anormal, eu sei
Três dias de Havaí
depois da crise.
É o mínimo que eu preciso
para realizar as mudanças
que a vida quer pra seguir adiante
Três dias de Havaí
Andar na areia, mergulhar no mar
às três da tarde
Nenhum compromisso de horário
Três dias de Havaí
Apesar da crise política
Do menino me pedindo 10 centavos
Da pressão da sociedade
Da onda negra
Da mulher do lado falando dos problemas familiares
Três dias de Havaí
Isso é tudo o que eu preciso
Agora.
- Acorda, vagabundo!
Sou vagabundo não
Quero só fumar meu negocinho
Ir à praia e pensar
E pensar
(e pensar)
E fazer o que sei fazer
Sem pretensão, sem arrogância
Com prazer e sofrendo muito
Não há outra escolha
Três dias de Havaí
E uma cerveja
É tudo o que eu preciso.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Quem é você?

DE BAR EM BAR (85) – Delirium Café


Esta é a primeira incursão ao boteco depois do pequeno contratempo que tive com um tal osso chamado tíbia. Ficou estressado, coitado. Ainda não estou ok, mas volto a campo mesmo assim, indo e voltando de táxi, de porta a porta, pois praticar é fundamental sob pena de perder a forma etílica. Aproveito então a oportunidade para retornar, literalmente, com alguma dose de sofisticação. Por isso dessa vez fui ao Delirium Café, primeira filial brasileira do bar de Bruxelas que tem o maior cardápio de cervejas do mundo, famoso pelos 2004 rótulos atestados pelo Guiness. Aqui não são tantos, mas de qualquer forma a variedade impressiona. É um paraíso.

Cheguei à simpática e singela casa de dois andares na Barão da Torre por volta de 20h. Não sabia ao certo o número do bar porém à medida que se passa da esquina com a Farme de Amoedo a fachada surge inconfundível, em seu tom de azul claro e seus elefantinhos cor-de-rosa. Não tem erro. Lá dentro, a festa para os olhos é ainda maior: mal se entra na casa, a despeito da bela decoração com mais elefantinhos e com cartazes e adereços relacionados à bebida e do balcão inteirinho de madeira, é impossível não ser atraído logo para a prateleira que ocupa uma parede toda, com garrafas dos mais variados estilos, tamanhos e procedências. É, de fato, um paraíso.

Sento-me inicialmente numa das mesinhas altas e redondas que ficam em frente ao balcão, próximo da entrada. Nesse momento, há apenas uma mesa ocupada, no fundo do salão. Em algumas das mesas perto da imponente prateleira, funcionários retiram e limpam algumas garrafas de caixas que provavelmente tinham acabado de chegar. Peço um chope da marca da casa, a Delirium Tremens, mas me informam que o barril também tinha chegado havia pouco e não seria possível colocá-lo para uso naquela noite. Bem... sendo assim, opto pelo chope da Therezópolis Gold, que não decepciona. Muito pelo contrário. Tomo dois antes de passar para o salão propriamente, tão logo os rapazes terminem o trabalho que a rigor não deveria estar sendo feito com clientes na área. O paraíso também tem seus problemas.

Bem acomodado estrategicamente ao lado do centro da prateleira (para esta, sim, caberiam os gritinhos histéricos de um bando de homens num certo comercial da Heineken – embora até goste da marca), começo a estudar o cardápio. E a questão shakespeareana aqui não é o que pedir, mas o que dá para pedir. Gosto muito, por exemplo, da cerveja belga Duvel e adoraria pedir a garrafa grande, de 600 ml, mas custa a bagatela de 69 reais. Achou caro? Pois este é na verdade quase um preço médio das garrafas grandes importadas. Algumas custam bem mais do que isso. Quer também um exemplo? Fiquemos no bíblico trio, também belga, das cervejas Judas, Lúcifer e Deus. Não estou brincando, o papo é sério... Quanto vale Deus? Essa é sem dúvida uma boa questão. Vale muito, caro leitor, independentemente da sua religiosidade. Na casa dos três dígitos.

Então entre belgas, americanas, alemãs, tchecas, inglesas, espanholas, francesas e muito mais, escolho a própria Delirium Tremens Ale, de 300 ml. Não poderia sair daqui sem provar a marca da casa. Para acompanhar, peço o creme de cerveja com queijo e os croquetes de carne e gorgonzola. Outros petiscos do cardápio: mexilhões, pastéis de mexilhões e de camarão, salsichas, bolinho de aipim com carne seca, linguiça com provolone, filé aperitivo ao molho de cerveja brown, croquetes de queijo St. Paulin, sanduíches, presunto cru com mussarela de búfula e rúcula e os tradicionais mexilhões com fritas. Entre os pratos, bife à milanesa com salada de batata, baby beef ao molho de cerveja com fritas e filé a Trois Poivre com salada verde. Os petiscos vieram excelentes, e a cerveja Delirium, de teor alcoólico de 8,5 %, o mesmo de minha preferida Duvel, é também deliciosamente inebriante.

A esta altura, a mesa ocupada do fundo do bar, que tem três colegas de trabalho, relaxados, rindo, já se prepara para ir embora. Mas ainda ouço um deles, o gordinho da cara vermelha, que antes falava alto que “após a implantação do sistema o rodízio de tarefas se tornou perfeito...”, agora depois de várias saideiras dizia que “só errei com uma pessoa...”. E saem ruidosamente. Mas não fico sozinho por muito tempo. Logo aparece um jovem casal e diante do bar praticamente vazio eles sentam-se na mesa exatamente ao meu lado. Como admitiu depois o gordinho, nem tudo é perfeito.

Estudo novamente o cardápio para uma última pedida. Assim como experimentar a Delirium para mim era quase uma necessidade, sair de um bar belga sem provar os mexilhões com batatas fritas não existe. Peço portanto a combinação que é especialidade da casa e vem numa caçarola com maionese fresca. Para acompanhar, sigo a sugestão do ótimo garçom, que realmente entende do seu negócio, e tomo a brasileira artesanal Dado Bier Belgian Ale. Os mexilhões vieram macios, saborosos e inacreditavelmente robustos. As batatas cumpriram seu papel coadjuvante com a crocância adequada. E a cerveja pedida, também com alto teor alcoólico, se fez valer a pena, principalmente no quesito custo/benefício.

A vontade é de continuar, pedir outra dica ao preparado garçom, e na sequência acenar alegremente para o elefantinho, na parede, que está rindo para mim. Não precisaria nem disfarçar para o casal ao lado, pois eles estão aos beijos efusivos e nem sabem que o mundo não parou. Mas acontece que se o paraíso existe, ele também é caro. E para o meu bolso já deu. Pago a salgada conta e antes de sair vou ao banheiro. Na volta ouço na passagem o simpático elefantinho me perguntar: “Quem é você?” Mas isso eu já não tenho certeza. Saúde e até a próxima.

Delirium Café – Rua Barão da Torre, 183, Ipanema (2502-0029)

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Profeta Gentileza de segunda mão

p o e s i a
(algum desvario
amor às palavras
sensibilidade amor
às palavras e trabalho
árduo) gera poesia