sexta-feira, 3 de julho de 2009

Noel e Cartola dão a bênção

DE BAR EM BAR - Beco do Rato


Nas paredes de azulejos em preto e branco estão os bambas eternizados em tinta a óleo abençoando a casa. Pixinguinha, Noel Rosa e Cartola de um lado. Beth Carvalho, Walter Alfaiate, Dona Ivone Lara e João Nogueira de outro. No cardápio, preciosidades como caldos de ervilha, mocotó e feijão; sanduíches de calabresa e pernil com abacaxi; jiló, moela, maxixe e quiabo. E o famoso pastel de angu. Estou falando do Beco do Rato, bar que não poderia estar em outro local que não a Lapa (e fica numa rua nas entranhas do início do bairro – se é que isso é possível).

Fui lá uma noite dessas. A chegada é como que uma inspiração. Na confluência de ruas outrora perigosas, o bar resplandece no escuro. O público era, curiosamente, bem eclético: duplas de amigos, pessoal do trabalho, uma família inteira com as crianças correndo pelo salão, casais e uma mesa com três meninas lindas. O astral é alto. Peço uma cervejinha e infelizmente não tem nem Original, nem a ótima Serra Malte; já acabaram, como me explicam os solícitos garçons. Vou então de Antarctica, que chega geladíssima. Para acompanhar, um dos carros-chefes: o pastel de angu – que é realmente tudo aquilo que dele comentam.

Muito frequentado pela rapaziada do samba, não é raro esbarrar por aqui com Moacyr Luz, Paulão Sete Cordas e Marquinhos PQD, entre outros grandes nomes do gênero. Situado exatamente na mesma área em que moraram Chiquinha Gonzaga e Madame Satã (e por onde também circularam Manuel Bandeira, Portinari, Sinhô e o já citado Noel), o Beco do Rato respira música. E tem, com efeito, bons shows que se revezam durante a semana, com o próprio grupo da casa, o Grupo do Beco, com o conjunto Receita de Choro e com o Samba Di Beco (este com direito a apresentação e versos de improviso de Fábio Bananada).

Fico sabendo que recentemente, no dia de São Jorge, o bar ofereceu feijoada de graça aos moradores de rua. Passo a gostar mais ainda do local. Até que apareceu o Márcio Pacheco, dono do Beco do Rato. Com sua fala macia de bom malandro e uma leve semelhança com o ex-jogador de futebol Paulo César Caju, Márcio sentou-se à mesa, dissertou com indisfarçável orgulho sobre seus músicos e em pouquíssimo tempo tornou-se um velho amigo. Trouxe até a sua cachacinha Germana de estimação, que segundo ele não faz mal nenhum e “não dá nada”. Sei. (Aliás, o meu dia seguinte é que sabe). Para garantir ainda um resto de sobriedade, peço o intrigante escondidinho de jiló com linguiça mineira, novo petisco do Beco e um dos concorrentes do Festival Comida Di Buteco.

Por fim, faltou falar de uma característica muito particular do Beco do Rato. Trata-se de um bar que não abre aos sábados. Sim, é isso mesmo, caro leitor. Talvez seja o único no mundo. Diversos botecos não funcionam às segundas-feiras. Conheço até quem não abra aos domingos. Mas aos sábados? Tinha tudo para dar errado. O bar, porém, é um sucesso. Pela ousadia, pela criatividade e pelos banheiros limpos e cheirosos como bumbum de bebê, palmas para o Beco que ele merece. Saúde e até a próxima.

Beco do Rato – Rua Joaquim Silva, 11, Lapa (2508-5600)

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