quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Um pé-sujo diferente

DE BAR EM BAR - REBOUÇAS

– Bota uma aí pra queimar a garganta.

O atendente serve uma dose generosa de 51.

– Posso cair dentro?

O trabalhador humilde vira tudo e faz aquela careta. Normal. Esta é uma cena que poderia ter acontecido em qualquer pé-sujo da cidade. Mas foi aqui no Rebouças, um pequeno grande boteco. Enquanto espero meu convidado chegar, sento-me num dos poucos bancos do balcão, peço uma Antarctica e observo o ambiente.

O bar é de dia uma pequena porta na Rua Maria Angélica. À noite ele cresce com mesinhas pela calçada. Nas prateleiras acima do balcão, noto garrafas de vinho que fogem ao padrão pé-sujo. Como também em relação às cachaças, aqui tem marcas como Lua Cheia, Germana, Magnífica, Salinas, Bento Velho, Chico Mineiro e Rainha do Vale. Não é pouca coisa. Um dos fregueses beberica uma dose de Red Label, ao lado do trabalhador que virou a 51.

– A música tá muito careta! Cadê os porras-loucas de hoje?

Quem fala é um senhor jovem, mais jovem do que muita gente que tem 18 anos. Discorre também sobre eleições, elogiando o candidato socialista Plínio de Arruda Sampaio, sobre vendedores de picolé no Pacaembu e seu método original de venda e ainda sobre a idade avançada das aeromoças atualmente. Interessante figura. Descubro depois que se trata do pianista Guilherme Vergueiro (não sabia como ele era). Mas eis que chega ao Rebouças meu convidado Toni Platão, que, antes de me dar um abraço, para pra falar com todo mundo. Aqui ele está em casa.

Toni Platão é, sem nenhum favor, um dos maiores cantores do Brasil. Num país que prima por excelentes cantoras, onde nasce uma diva a cada semana, Toni é quase um artigo de luxo. Deveria estar sendo disputado a tapa pelas gravadoras em crise. Mas a maioria delas sofre de miopia aguda. Toni Platão, gaiato, sempre que me encontra se refere à minha canção (em parceria com Frejat e Maurício Barros) Por você como “aquela canalhice”. Em seguida emenda: “Mas a Deborah adora”. Deborah é sua mulher, a coreógrafa Deborah Colker. Ainda bem que a Deborah adora.

Sentamo-nos numa mesinha na calçada. Para acompanhar a cerveja e o bom papo, peço uma empadinha de camarão. Veio ótima. Peço mais uma. Outras opções da casa: bolinhos de bacalhau, de camarão com catupiry, pastéis de carne, queijo, camarão e carne seca, sanduíche de carne assada, cachorro quente, presunto Parma. Todos os petiscos expostos parecem gozar de boa saúde.

Como não poderia deixar de ser, o assunto gira em torno de futebol, especificamente sobre como equilibrar o casamento e os 1500 jogos que passam na tevê, música digital (“tá faltando o discurso”) e filhos eternos. Pelo celular, Platão monitora o estudo do seu Antonio Bento, de 10 anos, que tem teste de matemática no dia seguinte. E ainda cumprimenta a nova leva de frequentadores, agora o turno da noite. Ele conhece desde o negão que coordena o ponto de táxi em frente, o Lafond (“aqui todos têm apelido”), até a florida mesa ao lado, recheada de gatas extraordinárias, como diria Caetano. Vai começar o jogo da nova seleção brasileira. Vamos para o interior do bar. Tudo certo no Rebouças – e no campo, com Ganso, Neymar e Pato. Saúde e até a próxima.

Bar Rebouças – Rua Maria Angélica 197, Jardim Botânico (2286-3212)

3 comentários:

  1. ... e por falar em apelido... grande Cássia :-)

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  2. Também esqueci de dizer que ele é tricolor, né. (Atualmente sorrindo de orelha a orelha com o timaço que a Unimed $$ montou.)

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