DE BAR EM BAR – Rosa de Ouro
Conheci o jornalista Ramon Mello quando fui entrevistado por ele há uns três anos (por ocasião do lançamento de um livro meu). Logo no início daquele papo, nas primeiras indagações, percebi que ele era também artista num sentido amplo. Depois disso, de fato, ele surgiu com livro de poesia (Vinis mofados), a curadoria da obra do ótimo escritor Rodrigo Souza Leão (morto precocemente), diversas entrevistas com nomes (realmente) de peso e uma peça de teatro (adaptada de uma obra de Souza Leão). Hoje ele é o meu convidado neste boteco de belíssimo nome: Rosa de Ouro.
Quando fui combinar com ele onde iríamos, sugeri uns quatro ou cinco bares. Mas ele devolveu: “Conhece o Rosa de Ouro, no início da Voluntários da Pátria? Adoro aquele lugar barulhento, e tem o melhor garçom do Rio, o Miguel.” Topei no ato, pelos adoráveis motivos alegados (o “lugar barulhento” e, claro, o nome improvável do garçom).
Chego primeiro, por volta de 18:30 h, e o pequeno bar inicia o seu movimento camaleônico para o turno da noite – assim como ocorre, por exemplo, com o Bar Rebouças no Jardim Botânico: durante o dia um pé-sujo normal, de noite um bar descolado. A essa hora ainda consigo pegar uma mesinha de calçada na beirada do bar. A vista é panorâmica pro rush dos automóveis e dos passantes e para as duas outras mesas por enquanto ocupadas do lado de fora, com dois amigos numa e noutra um cara e uma menina, ambas as duplas nos seus 20 e poucos anos.
Enquanto tomo uma primeira Antarctica, eis que chega o poeta Ramon (com seus 26 para baixar consideravelmente a média de idade da mesa), chega inquieto, pede um copo, puxa logo uma cigarrilha e o papo não para mais. A fim de acompanhar nossos pensamentos líquidos (título de um poema dele), me apresenta ao garçom Miguel, que ainda não havia se materializado (muito simpático e totalmente diferente do que eu imaginava). Pedimos mais outra cerveja e uma pizza marguerita, uma das especialidades da casa, levinha, na linha do bom, bonito e barato. Outras opções: iscas de fígado, salsichão, feijão amigo, bolinho de bacalhau. E os pratos: milanesa à parmegiana, estrogonofe, fritada de bacalhau e viradinho à paulista.
Ramon Mello, nascido em Araruama e emancipado aos 16 (desde cedo decidiu que sairia da cidade), veio para o Rio estudar teatro na Escola Martins Pena e acabou fazendo também jornalismo. Em oito anos de Rio, morou em seis lugares diferentes e nesse tempo, a partir de suas entrevistas, conheceu boa parte dos faróis da cultura brasileira. Entrevistou, por exemplo, seus ídolos João Gilberto Noll e Fernanda Montenegro. E mais nomes como Sérgio Britto, Ferreira Gullar, Michel Melamed, Heloísa Buarque de Hollanda e o próprio Rodrigo Souza Leão (de quem se tornou próximo a partir de um único encontro e de quem recebia toda semana uma ligação telefônica, sempre no mesmo dia e horário). Depois de sua morte, recebeu a obra do amigo para cuidar.
Algumas cervejas consumidas, o bar está fervilhando com a calçada apinhada de gente. O movimento do tradicional pé-sujo de bairro cresceu muito em função dos estabelecimentos que se avolumaram ali perto: cinemas, livrarias, pé-limpos e boate. O escritor Ramon, depois de nosso encontro, ainda vai a um lançamento de livros de dois amigos. Ainda pedimos com a saideira uma porção de bolinho de bacalhau, que veio apenas razoável. (Mas acho que ninguém aqui se importa muito.) Para finalizar, pergunto ao meu promissor convidado o que ele tem ouvido ultimamente. Moska e o grupo português Três Marias. O inquieto Ramon é um cara antenado, assim como esse bar Rosa de Ouro (cujo nome foi tirado de um histórico show de Paulinho da Viola e Clementina de Jesus), do bom Miguel. Sim, caro leitor, existe um garçom chamado Miguel. Saúde e até a próxima.
Rosa de Ouro – Rua Voluntários da Pátria 1, lj 11, Botafogo (2527-0565)
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
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